Educação Inclusiva
A inclusão dos portadores de necessidades educativas especiais tem sido proposta norteadora e dominante da Educação em vários países, incluindo-se o Brasil (Enumo, 2005). Historicamente, em 1972, um grupo de profissionais da Escandinávia forma o princípio de normatização apregoando que todas as pessoas portadoras de necessidades especiais têm o direito de usufruir condições de vida o mais comum ou normal possível, garantindo o direito de ser diferente e de ter suas necessidades reconhecidas e atendidas pela sociedade (Cardoso, 1992; Carvalho, 1994; Glat, 1998).
A exclusão nas escolas lança as sementes do descontentamento e da discriminação social (Stainback & Stainback, 1999). A educação é uma questão de direitos humanos, e os indivíduos com deficiências devem fazer parte das escolas, as quais devem modificar seu funcionamento para incluir todos os alunos. Esta é uma mensagem que foi claramente transmitida pela Conferência Mundial de 1994 da UNESCO sobre Necessidades Educacionais Especiais na Declaração de Salamanca, documento que versa os princípios, política e práticas, primando pelo direito universal à educação, possibilitando uma escola para todos.
Nas ultimas décadas, a Inclusão Escolar de sujeitos portadores de necessidades especiais no ensino regular tem sido tema de pesquisas e de eventos científicos, abordando-se pressupostos teóricos político-filosóficos, formas de implementação das diretrizes estabelecidas na referida declaração. Além disso, discutem-se os diversos enfoques pesquisados que envolvem as opiniões docentes e de demais profissionais da comunidade escolar sobre a proposta inclusiva e a participação neste tipo de projeto, uma vez que professores e diretores apresentam funções essenciais na estrutura e no funcionamento do sistema educacional (Sant’Ana, 2005).
A escola é um dos meios mais eficazes para transformar a realidade da exclusão social, e para se construir uma sociedade mais justa e igualitária, na qual todos, sem exceção, possam gozar dos mesmos direitos e oportunidades (Leão, Garcia, Yoshiura & Ribeiro, 2006). No entanto, a implantação da educação inclusiva tem encontrado limites e dificuldades, em virtude da falta de formação dos professores das classes regulares para atender às necessidades educativas especiais (Sant’Ana 2005).
Segundo Sant’Ana (2005), diante deste quadro, torna-se importante que os professores sejam instrumentalizados para que possam atender as diferenças apresentadas pelos alunos. Estudos realizados por Goldberg (2002) revelaram que a forma como o professor concebe seu aluno determina suas práticas e atitudes em relação ao mesmo. Assim, em face das mudanças propostas na educação, cada vez mais tem sido reiterada a importância da preparação de profissionais e educadores, em especial o professor de classe comum (Sant’Ana, 2005). É evidente que ainda muitas mudanças são necessárias para esta nova concepção de escola conforme Leão, Garcia, Yoshiura, Ribeiro (2006), mas diante da inclusão educacional é importante se considerar a opinião do professor (Leão, 2004). O corpo docente tem sofrido muito diante desta situação, por não estar preparado para enfrentá-la (Naujorks & Kempfer, 2001).
Vitaliano (2007) defende a necessidade de se empreender ações para promover a preparação dos professores. Segundo Beyer (2006), ao tratar-se da formação do professor para incluir alunos com necessidades especiais, é preciso compreender a educação inclusiva como uma visão de vida, mais que um projeto educacional. É um movimento que surgiu para questionar, confrontar e reestruturar o modo de organização escolar que tem como característica básica a homogeneidade entre os alunos.
O que está em questão no ensino inclusivo é oferecer aos alunos os serviços de que necessitam em ambientes integrados e proporcionar aos professores atualização de suas habilidades para que possam adquirir novas ferramentas para trabalhar com alunos acadêmicos e socialmente deficientes (Stainback & Stainback, 1999). Segundo Coll, Marchesi e Palacios (2004), a formação dos professores e seu desenvolvimento profissional são condições necessárias para que se produzam práticas integradoras positivas na escola, sendo muito difícil avançar no sentido das escolas inclusivas se os professores não adquirirem uma competência suficiente para ensinar a todos os alunos.
O estudo feito por Sant’Ana (2005) mostra que a implantação da educação inclusiva tem encontrado limites e dificuldades, em virtude da falta de formação dos professores das classes regulares para atender as necessidades especiais educativas. A pesquisa busca o processo reflexivo sobre os aspectos que tem permeado a inserção do aluno com necessidades especiais e a falta de preparo e de amparo para a inclusão escolar. Para tanto, foram elaboradas entrevistas semi-estruturadas e um questionário de identificação. Participaram dez professoras e seis gestoras no contexto da inserção dos alunos com deficiências na rede regular de ensino de uma escola do ensino fundamental da rede estadual do interior paulista. Os resultados apontaram para a importância da instrumentalização e do preparo técnico adequado com cursos de aperfeiçoamentos e de capacitação docente para que os professores possam atender as diferenças apresentadas pelos alunos.
Todas as estratégias e argumentos pelos qual a Escola tradicional resiste à inclusão refletem a sua incapacidade de atuar diante da complexidade, da diversidade, da variedade, do que é real nos seres e nos grupos humanos (Cacciari, Lima & Bernardi, 2005), é o que revela o estudo feito com uma equipe multidisciplinar de pedagogos, fonoaudiólogos, psicólogos, neurologistas, psiquiatras e professores com experiência em inclusão escolar num centro de saúde na zona oeste de São Paulo. Foi oferecido um espaço de escuta para auxiliar estes profissionais nas necessidades que permeiam todo processo de inclusão, podendo verificar o interesse de alguns profissionais e a atitude paralisada de outros quando se deparam diante das dificuldades e da complexidade da demanda de novos conhecimentos na prática inclusiva. Por meio dos trabalhos realizados, foi possível perceber a importância dos professores para comprovar como as crianças evoluem no espaço escolar auxiliando a equipe clínica no atendimento multidisciplinar dos sujeitos portadores de necessidades especiais.
Na pesquisa de Vitaliano (2007), foi analisada a necessidade de preparação pedagógica de professores de licenciatura para a inclusão de alunos com necessidades especiais. Os participantes desta pesquisa foram 178 professores universitários de 13 cursos. Utilizou-se um estudo de caso, com coletas de dados em duas fases, sendo na primeira fase realizadas entrevistas semi-estruturadas e na segunda um questionário. Os achados apontaram que os professores universitários estavam motivados para aprender a incluir alunos com necessidades especiais educativas. Além disso, estavam dispostos a utilizar metodologias adequadas e preparar os materiais didáticos acessíveis a eles.
Stainback & Stainback (1999) defendem a necessidade de dar oportunidade aos professores para planejar e conduzir a educação como parte de uma equipe, onde a colaboração permite-lhes trocas e consultas uns aos outros proporcionando apoio psicológico. A especialização, o pensamento e as competências dos professores são objetos de inúmeros trabalhos inspirados na antropologia cognitiva, na psicologia e na sociologia, bem como na análise das práticas pedagógicas, porém o mais sábio é dizer que os professores devem dominar os saberes a ser ensinado, ser capazes de dar aula, de administrar a turma e de avaliar (Perrenoud, 2000). Dessa forma, é reforçada uma relação determinista entre o desempenho do professor e de seus alunos possibilitando um controle diferenciado da aprendizagem e sua mediação pedagógica (Dias & Lopes 2003).
Competências do professor
A profissão do professor é uma prática relacional, em razão de desenvolver múltiplas interações e limitações diante das situações e das incertezas provenientes das relações grupais envolvidas nos processos de aprendizagens (Fiorot & Ortega, 2007). Para o atendimento das necessidades educativas de todas as crianças, com ou sem deficiência, a sociedade requer dos profissionais que nela atuam, novas competências para atender às exigências de uma comunidade em que acontecimentos cada vez mais diversificados passam a ser necessários.
Competência pode ser definida como uma capacidade de agir eficazmente em um determinado tipo de situação, apoiada em conhecimentos, mas sem limitar-se a eles, colocando em ação vários recursos cognitivos complementares que são construídos e armazenados ao longo das experiências e da formação pessoal e profissional. (Perrenoud, 1999). A noção de competência, segundo Perrenoud (2000), designa a capacidade de o professor mobilizar diversos recursos cognitivos para enfrentar um tipo de situação e administrar a progressão das aprendizagens em sala de aula. Por isso, investigar o processo de profissionalização dos professores demanda uma discussão acerca do conceito de competência numa prática reflexiva, pressupondo voltar-se para dentro de si mesmo, a fim de entender as peculiaridades apresentadas pelos alunos.
Concebidas dessa maneira, as competências são importantes metas da formação. Perrenoud (1999) sugere que elas podem responder uma demanda social dirigidas para a adaptação ao mercado a as mudanças sociais fornecendo os meios para aprender a realidade evolutiva do sistema educacional. Para o autor, toda a competência está, fundamentalmente, ligada a uma prática social de certa complexidade. Acrescenta, ainda, que para elaborar programas escolares que visem ao desenvolvimento das competências é necessário extrair situações-problema que permitam um confrontamento da prática profissional e a correta identificação das situações relativamente banais.
Diversos estudos são realizados acerca da formação do professor e sua atuação em sala de aula (Dias & Lopes, 2003; Fiorot & Ortega, 2007; Junkers, 2006). Neste sentido, Dias e Lopes (2003) desenvolveram um estudo com objetivo de revisão de literatura na área da formação docente. Para tanto, analisaram documentos curriculares sobre a formação do professor no Brasil. Estes documentos registram a inconsistência dos estudos sobre a relação e a formação profissional do professor. Os autores fizeram uma análise como relações globais e locais constituem o processo de controle do trabalho docente via currículo por competências. Um dos mecanismos apontados pelos documentos oficiais para o controle da formação de professores é o processo de avaliação de competências.
Dias e Lopes (2003) defendem que as competências devam surgir no currículo da formação do professor para instituir uma nova organização curricular, na qual o método de desenvolver o ensino pretende ser a questão central. Porém, esse deve ser entendido como processo de constante formação, objetivando atender aos princípios de flexibilidade, eficiência e produtividade dos sistemas de ensino, com desafio de tornar a formação de professores uma formação profissional de alto nível. O modelo de competências na formação profissional de professores atende à construção de um novo modelo de docente, além de atender às novas finalidades curriculares e às diferentes demandas da situação de trabalho do professor.
Para Junkers (2006), as pesquisas e estudos realizados nesta área demonstraram a dificuldade em se estabelecer a articulação entre o saber científico e o saber prático, necessitando de uma organização mais sólida e harmoniosa na formação do professor. A autora realizou uma pesquisa com o propósito de entender como se processa a escolha e a formação dos que escolhem trabalhar com crianças portadoras de necessidades especiais. Participaram dez escolas especiais da APAE no estado de Santa Catarina, com o total de 125 professores. Foram utilizados um questionário e entrevistas semi-estruturadas. Os dados foram analisados de forma quantitativa e qualitativa. Os resultados indicaram problemas e dificuldades em vários níveis, constatando-se que o processo de construção da profissão docente da educação especial e o desenvolvimento profissional necessitam de profundas discussões e reflexões no que se refere à formação inicial e continuada dos professores.
Fiorot e Ortega (2007) apontam, também, para a discussão acerca da formação do professores. Os autores realizaram um estudo numa escola particular em Vitória, no estado de Espírito Santo, onde buscaram verificar o modo de ensinar de professoras em um contexto de jogo de regras. Participaram quatro professoras da 4ª série do ensino fundamental, com a colaboração de quatro alunos. Foi utilizada observação durante o contexto do jogo Traverse, utilizado como instrumento metodológico no ato de ensinar, necessitando domínio dos processos de aprendizagem e sobre os procedimentos do ensino. Os resultados demonstraram as dificuldades enfrentadas pelas professoras em observar as diferentes ações dos diferentes alunos, havendo um predomínio de procedimentos com características negativas sendo identificadas algumas dificuldades apresentadas pelas professoras, tanto no momento de instruir quanto no de mediar.
Perrenoud (2005), afirma que a abordagem por competência muda o oficio do professor, pois ele incita: a) a considerar os saberes como recurso a serem mobilizados; b) a trabalhar regularmente por problemas; c) a criar ou utilizar outros meios de ensino; d) a negociar e desenvolver projetos com seus alunos; d) a adotar um planejamento flexível; e) a improvisar; f) a estabelecer e explicitar um novo contrato didático; e, g) a praticar uma avaliação formadora, em situações de trabalho, a caminhar no sentido de uma menor comparti mentalização disciplinar.
As competências são meios de controlar, simbólica e concretamente, as situações da vida, podendo ser fundamental à aprendizagem no desenvolvimento de saberes, mobilizando recursos para enfrentar situações concretas ou abstratas, comuns ou especializadas, de fácil ou difícil acesso. Uma competência permite enfrentar regular e adequadamente um grupo de tarefas e de situações, recorrendo a noções, conhecimentos, informações, procedimentos, métodos, técnicas (Perrenoud, 2005).
Objetivos
Em face estas considerações, o presente estudo visou investigar as competências pertinentes aos professores das Séries Iniciais nos processos inclusivos em sala de aulas regulares.
MÉTODO
Delineamento
Foi utilizado um delineamento de estudo de caso coletivo (Stake, 1994), buscando-se examinar as competências que o professor percebe necessárias em seu papel no processo de inclusão escolar. Desse modo, investigaram-se tanto as peculiaridades presentes em cada caso, como as semelhanças entre os mesmos.
Participantes
Participaram deste estudo de quatro professores (as) com experiência no contexto de inclusão escolar. Os professores (as) deviam atuar nas Séries Iniciais do Ensino Fundamental, uma vez que essas caracterizam o processo de iniciação escolar. As participantes foram recrutadas em Escolas Públicas e Privadas da cidade de Porto Alegre, das quais a pesquisadora não possui nenhum vínculo. Esses dados foram levantados e, posteriormente, utilizados para análise. Com isso, objetivou-se garantir a diversidade dos casos (Stake, 1994).
Perfil das professoras entrevistadas
A seguir são apresentados os resumos dos perfis das professoras investigadas.
Professora 1
A professora 1, tem sessenta anos, com vinte e cinco anos de atuação escolar no ensino fundamental em escola estadual do município de Porto Alegre. Sua carreira com portadores de necessidades especiais iniciou no ano de 1988 numa escola da periferia da cidade. P1 possui formação superior incompleta em pedagogia, porém ao longo de sua carreira profissional buscou cursos de especialização em inclusão escolar.
Professora 2
A professora 2, tem trinta e três anos de idade e dez anos de atuação em escola do ensino fundamental em escola estadual do município de Porto Alegre, Teve pouca experiência com portadores de necessidades especais. Trabalhou oito anos com crianças das series iniciais do ensino fundamental. Atualmente é vice-diretora e trabalha em sala de aula fazendo substituições de professor. P2 possui formação no nível superior em educação física e não tem experiência com portadores de necessidades especiais na escola atual.
Professora 3
A professora 3, tem quarenta e dois anos e atua desde os dezenove anos nas serie iniciais do ensino fundamental em escola privada da cidade de Porto Alegre. P3 no ano de 1998 retornou para graduação, concluindo o nível superior pedagogia e após especializou-se em orientação e supervisão escolar. Sua carreira com portadores de necessidades especiais iniciou no ano de 2002.
Professora 4
A professora 4, tem trinta e oito anos e atua com primeira serie do ensino fundamental há vinte anos em escola privada da cidade de Porto Alegre. G.O .fez magistério no nível médio, é bacharel em administração de empresa e possui especialização em psicopedagogia. Na sua carreira tem pouca experiência com inclusão escolar no ensino regular.
Instrumentos
A Ficha de Caracterização da Escola (Goldberg, 2002) busca descrever as principais características da instituição, como a estrutura, quadro de pessoal, etc. Cópia encontra-se em anexo (Anexo A).
A Entrevista de Identificação de Competências do Professor no Contexto Escolar foi desenvolvida como roteiro para este estudo, tendo caráter semi-estruturado. A entrevista abrange informações referentes à identificação do professor e aos tópicos investigados, a saber, questões referentes à formação do professor, suas experiências, expectativas e sentimentos no contexto de inclusão. Cópia em anexo (Anexo B).
Procedimentos
Contatou-se duas escolas públicas e duas privadas da cidade Porto Alegre que possuíssem situações de inclusão de crianças com Necessidades Educativas Especiais, por meio de critérios de conveniência. Após a identificação das escolas que atendiam aos critérios, essas foram convidadas a participar do estudo sendo dados os esclarecimentos quanto à natureza e ao objetivo deste. Em cada escola foi indicado pela direção uma professora atuante nas Séries Iniciais do Ensino Fundamental para seleção de um professor. Posterior ao consentimento da instituição (Anexo C) e realização do sorteio, foi contatado o professor para esclarecimentos necessários e o preenchimento do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido. A cópia encontra-se em anexo (Anexo D). A entrevista foi realizada na instituição na qual cada professor (a) está vinculado (a) de acordo com a conveniência do participante e da pesquisadora. As entrevistas foram gravadas e posteriormente transcritas para fins de análise. A administração dos instrumentos durou cerca de uma hora.
Considerações éticas
Os participantes do presente estudo foram informados a respeito dos objetivos e procedimentos da pesquisa podendo decidir livremente sobre a disponibilidade de participarem do estudo. Com isso, esteve assegurada a autonomia dos indivíduos, sendo que estes poderiam também desistir de participar da pesquisa em qualquer etapa da mesma. Os procedimentos desse estudo apresentaram risco mínimo aos participantes, já que não estavam sujeitos a atividades diferentes de seu cotidiano. Em qualquer etapa da pesquisa foi oferecido acompanhamento psicológico gratuito aos professores, caso fosse necessário, o que não ocorreu À privacidade e a confidenciabilidade foi garantida aos participantes, sendo que o material obtido através da pesquisa foi devidamente arquivado. Tal pesquisa não trouxe qualquer malefício aos participantes, pode inclusive, apresentar alguns benefícios, na medida em que foi disponibilizado aos mesmos um espaço de reflexão e acolhimento às suas necessidades. Desta forma, foram assegurados todos os cuidados necessários aos professores que se dispuseram a participar, o que reforçará o beneficio que os dados obtidos possam representar para a população em geral, especialmente no que se refere à formação do professor.
O presente projeto foi submetido ao Comitê de Ética do Instituto de Psicologia e todos participantes assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.
Análise dos Dados
Os dados foram examinados por meio da Análise de Conteúdo (Bardin, 1977), descrevendo em categorias exaustivas e sistemáticas as informações investigadas. A análise foi realizada posteriormente através de categorias geradas dos conteúdos das respostas dos professores aos tópicos investigados.
RESULTADO E DISCUSSÃO
Para investigar as competências do professor inclusivo no contexto escolar foram entrevistadas quatro professoras das series iniciais do ensino fundamental, sendo duas professoras da rede de ensino publico e duas professoras da rede de ensino privado da cidade de Porto Alegre no estado do Rio Grande do Sul. Na análise de conteúdo, foram estabelecidas em três eixos categóricos a partir das respostas das professoras entrevistadas. Os resultados encontrados foram agrupados nas Tabelas, a saber: A Tabela 1 apresenta os dados obtidos após a transcrição que representam a experiência docente e o histórico educacional das profissionais do grupo pesquisado. A Tabela 2 demonstra as respostas das professoras sobre competência profissional. Enquanto na Tabela 3 estão presentes as respostas dos principais desafios e habilidades que as professoras entrevistadas percebem necessárias para promover competências profissionais no contexto de inclusão escolar no ensino regular.
Experiência docente
A partir dos relatos, constatou-se que as quatro professoras entrevistadas já tiveram experiência pelo menos uma vez com processos de inclusão escolar nas series iniciais de ensino fundamental conforme a Tabela 1 (Ex: primeira e terceira serie do ensino fundamental (...) [P1]; segunda serie (...) [P3]).
Tabela 1
Eixo Categórico: Experiência Docente
Formação profissional
Desenvolvimento profissional
Pratica em sala de aula com portadores de necessidades especiais
Docência no ano de 2008 com alunos portadores de necessidades especiais no ensino regular
Experiência Docente
Já quanto à formação profissional, todas as professoras que participaram da pesquisa possuíam formação no curso de magistério do ensino médio, porém cada uma delas seguiu uma trajetória acadêmica diferente, o que possibilitou a busca de conhecimentos de acordo com uma historia educacional variada e conforme as necessidades profissionais que surgiram ao longo da profissão docente de cada uma.
Esses resultados se assemelham dos encontrados num estudo sobre educação inclusiva na Áustria, Islândia, Portugal e Espanha pesquisados por Pacheco (2007), que indicaram conforme o autor que as professoras utilizaram uma combinação de varias maneiras para aprofundar seu conhecimento, habilidades e compreensão, principalmente em relação às demandas de classes regulares com portadores de necessidades especiais.
No que concerne ao desenvolvimento profissional, cada professora buscou individualmente programas, cursos, oficinas, projetos para a obtenção de conhecimento, de habilidades e de compreensão adicional para o seu trabalho de inclusão escolar nos anos iniciais do ensino fundamental. Cursos e programas para formação de professores para trabalhar com os processos de inclusão em sala de aula no dia-a-dia somente aconteceu em uma das escolas particulares a partir do relato da professora 3. (Ex. Eu acho que fui mais preparada no ambiente de trabalho, eu não tenho duvida, assim, porque a escola subsidia vários cursos e teve um olhar para aquele professor que realmente naquele momento se mostrava disponível em aceita, né? Esse desafio, (...) [P3]).
Para três professoras, a prática em sala de aula com portadores de necessidades especiais tem como ponto positivo a possibilidade de crescimento pessoal. Isso demonstra uma disponibilidade para especialização interna e individual que permitiu através das experiências vivenciadas uma busca reflexiva, compartilhamento e resolução de problemas diários que refletem os interesses dos alunos e dos próprios professores. (Ex. É um desafio (...) Questão vocacional (...) Alguma coisa nova (...) [P2]; Vontade de mudança (...) Lidar com as diferenças (...) [P4]). Pacheco (2007), destaca a importância e a validade de observar a ênfase no treinamento individual e colaborativo e na troca de habilidades e conhecimento entre o pessoal das escolas, em sua pesquisa o termo inclusão apareceu como uma comunidade de pessoas diferentes que atingiam um nível mais alto de forma conjunta e não sozinhas.
Ao analisar os dados a partir do material coletado nas entrevistas com as professoras sobre a prática docente no ano de 2008 que se encontram na Tabela 1 pode-se constatar que as diferenças nas respostas variaram conforme a vivencia individual e a pratica na docência diária com alunos de inclusão em sala de aula no ensino regular, e o tempo de experiência com a necessidade de recursos pedagógicos para o bom desempenho profissional na área sendo moldado pelas necessidades da situação contextual de cada caso.
Esses achados demonstram que a formação do professor deve ser entendida como imprescindível para aquele que ensina (Junkes, 2006). O professor é a peça fundamental em todo o processo educativo, para tanto é necessário investir em seu desenvolvimento profissional. Porém, Pacheco (2007), defende a idéia de que os próprios professores possam educar-se fora de programas de treinamento específicos, podendo estudar seu próprio ensino e aprender através da reflexão e da solução de problemas.
Competências profissionais
Em relação ao conceito de competências os resultados indicam como Perrenoud (1999), sugere que construir uma competência significa aprender a identificar os conhecimentos pertinentes, estando já presentes, organizados e designados pelo contexto. As entrevistas com as professoras indicaram uma variação nos entendimentos na construção das suas competências conforme apresentado na Tabela 2.
Tabela 2
Competências Profissionais
Eixo Categórico: Competências profissionais
Capacitação e formação profissional
Conhecimento teórico- pratico
Habilidades pessoais
Relações sociais
Saber fazer
Vivencia X Experiência
Dentre os argumentos mencionados pelas professoras, obteve maior destaque o que atribui competências a noção de capacitação e formação profissional e conhecimento teórico – pratico. Perrenoud (2000), afirma que para organizar e dirigir situações de aprendizagem é indispensável que o professor domine os saberes, que esteja mais de uma lição à frente dos alunos e que seja capaz de encontrar o essencial sob múltiplas aparências, em contextos variados. Possivelmente isso ocorre do fato das professoras estarem sempre buscando um melhor preparo profissional na área da educação. Todas as professoras entrevistadas acreditam na importância da preparação de profissionais e educadores, em especial do professor de classe comum para o atendimento das necessidades educativas de todas as crianças, com ou sem necessidades especiais. (Ex: Eu já fiz vários cursos (...), No meio do caminho fiz algumas especializações pra inclusão (...) [P1]; Em 1998 voltei para graduação (...), Em 2002 fiz uma especialização (...) [P3]).
A partir da análise das entrevistas de acordo com a Tabela 2 podem-se identificar diferentes visões sobre competência entre elas as habilidades pessoais. Para Perrenoud (2000), conhecer os conteúdos a serem ensinados é a menor das coisas quando se pretende instruir alguém, pois a verdadeira habilidade consiste de um lado relacionar os conteúdos aos objetivos e, de outro, a situações de aprendizagem. As docentes que deram maior destaque ao tema foram as professoras P1 e P3 que vivenciaram diariamente a prática em classe comum a inclusão escolar em sala de aula no ano de 2008. A professora P3 que recebeu cursos e orientação formal na instituição privada em que trabalha complementou sobre importância nas relações sociais nos grupos de estudos para o desenvolvimento das competências no professor inclusivo. (Ex: De vivenciar e de aceitar esse diferente (...) As colegas tem que ter o cuidado, né? (...) Partilhar com outros colegas, envolvendo outras pessoas (...) [P3]).
Nesse sentido Perrenoud (1999) afirma que competências possuem múltiplos resultados, mas define principalmente como sendo uma capacidade de agir eficazmente em um determinado tipo de situação, apoiada em conhecimento, mas sem limitar-se a eles. Os resultados da pesquisa demonstraram que as professoras entrevistadas colocam em ação vários recursos cognitivos complementares, entre os quais estão os conhecimentos que constroem expressando a representação da sua realidade que armazenaram com o tempo de experiência e da formação pessoal.
Através dos relatos das participantes, foi demonstrada a necessidade das mesmas de buscarem ações que promovam a preparação dos professores no ensino inclusivo em sala de aula regular. (Ex: Alguns profissionais buscam ou estão num meio mais fértil (...), E eu digo por mim mesma (...), É mais fácil ficar informada como eu to dentro da universidade (...) [P4]). Esses resultados se evidenciam dos encontrados em outros estudos (Leão, Garcia, Yoshiura & Ribeiro, 2006; Leão, 2004; Sant’Ana, 2005), nos quais cada vez mais tem sido reiterada a importância da preparação de profissionais e educadores, em especial o professor de classe comum.
Segundo Beyer (2006), é preciso compreender a educação inclusiva para promover a formação do professor como uma visão de vida, mais que um projeto educacional. É um movimento que veio para questionar, confrontar e reestruturar o modo de organização escolar que tem como característica básica a homogeneidade entre os alunos.
Competências profissionais no contexto de inclusão escolar
Na Tabela 3 estão presentes as categorias relacionadas às respostas dos principais desafios e habilidades que as professoras entrevistadas vislumbram como importantes na promoção de competências profissionais no contexto de inclusão escolar no ensino regular.
As entrevistadas construíram sucessivamente suas competências a partir de suas praticas e de uma reflexão da experiência vivida. Dentre os argumentos mencionados pelas professoras foi possível perceber que as mesmas conhecem as principais habilidades do oficio e buscam a competência pratica na área do ensino. Entretanto, as competências somente têm valor segundo Junkes (2006), quando expressas em ações inscritas em projetos que permitam uma nova identidade profissional do docente, lhe conferindo o status de professor profissional, com o devido reconhecimento de uma especificidade, ele passa a ser reconhecido como profissional de ensino e da aprendizagem pela aquisição da devida competência indispensável ao ato de ensinar. A autora ressalta a importância de formar um oficio que vise à competência através do desenvolvimento dos saberes disciplinares tanto para professores experientes como aqueles em formação.
Os resultados do presente estudo em relação à importância da percepção das professoras parecem reforçar a noção de competência profissional no contexto de inclusão escolar no ensino regular conforme demonstrados na Tabela 3.
Tabela 3.
Competências profissionais no contexto de inclusão
Eixo Categórico: Competências profissionais no contexto de inclusão
Adaptação ao diferente
Adaptação da rotina em sala de aula
Adaptação e organização das tarefas
Adaptação curricular
Atendimentos especializados aos professores
Exigências legais
Habilidade para enfrentar dificuldades individuais que possa ocorrer
Infra estrutura
Trabalho em equipe
Trabalhar a formação continuada
Utilização de novas tecnologias
Para as professoras entrevistadas as competências caminham lado a lado com a disponibilidade interna e o compromisso profissional para enfrentar os desafios como a adaptação ao diferente. Destaca-se que apesar da falta de capacitação na formação profissional que deveria ser ofertada no ensino do oficio de magistério, os resultados revelaram que quanto maior o envolvimento da professora melhor é o desempenho da classe de ensino regular que está sob sua responsabilidade. (Ex: É um grupo especial que recebe o aluno especial, porque se esse grupo todo não fosse especial, eu não teria dado conta dum ano inteiro com alguns alunos, não era só um, eram vários (...) [P1]).
De acordo com as categorias: habilidades para enfrentar dificuldades individuais que possam ocorrer, atendimento especializado e trabalho em equipe, no eixo competências profissionais no contexto de inclusão as docentes consideraram relevantes os professores serem auxiliados nos processos que visam à competência no contexto de inclusão escolar junto às escolas de ensino regular com o propósito de buscar competências que colaborem para promover um maior desenvolvimento na carreira do professor das series iniciais do ensino fundamental de escolas regulares.
Esses resultados demonstram o sentimento de solidão enfrentado por muitas professoras no contexto contemporâneo da sala de aula e, em especial, no caso do ensino de alunos com necessidades especiais.
O estudo apontou a necessidade de uma política baseada em elementos que supram os desafios do ato de ensinar na escola conforme as exigências legais já que estes são exigidos pela sociedade e comunidade escolar.
As didáticas escolares, segundo as entrevistadas precisam ser conduzidas constantemente dando valor as próprias habilidades do professor como subsídios para utilização de novas tecnologias que auxiliem na adaptação curricular, nas tarefas e na rotina em sala de aula cabendo a cada docente um movimento importante na reestruturação do ensino visando à aprendizagem.
Da mesma forma, os resultados sobre a formação continuada, quando realizada, é pouco consistente para atender os processos de inclusão escolar, assim como a dificuldade de integração aos atendimentos especializados no trabalho em equipe. (Ex: O treinamento do professor pra dize o que ta acontecendo, entra em contato com quem, ah, assiste essa criança, se é medico, se é psicólogo, se é psiquiatra (...) [P2]). Esses achados vãos ao encontro da pesquisa feita por Junkes (2006), no qual se referem à superficialidade do preparo docente na formação do professor diante o atendimento multidisciplinar.
Na pesquisa as professoras referiram-se ao melhoramento do conhecimento, das habilidades e da compreensão após suas escolhas profissionais. Para elas o ato de lecionar correlaciona-se com o próprio desenvolvimento pessoal que está sempre ligado a mudança e ao sucesso profissional. (Ex: A essa altura me sinto muito cansada, é uma carga muito grande de trabalho, de comprometimento, de preocupações. Mas ao mesmo tempo tem uma satisfação muito grande, de participar, de ver os resultados, o crescimento dos alunos, e luto por um ideal com vontade de superação, de fazer algo mais (...) [P4]). Neste sentido, Pacheco (2007), defende a inexistência de uma receita única para o desenvolvimento do quadro de professoras com relação à educação escolar inclusiva, pois esta deve ser trabalhada em todos os níveis da sociedade. Perrenoud (1999), afirma que construir uma competência significa aprender a identificar e a encontrar os conhecimentos pertinentes.
Finalmente, as professoras consideraram relevante a adaptação da infra- estrutura dos estabelecimentos escolares visando uma maior abertura aos processos de inclusão social juntos das famílias e da comunidade. Para Junkes (2006), a educação inclusiva ainda é um sonho de nossa realidade, nenhuma escola e pouquíssimos professores estão preparados para receber alunos portadores de necessidades especiais. Para a autora, nas escolas faltam adaptações na infra-estrutura física e curricular. As docentes entrevistadas alertaram também que a participação governamental é essencial para a concretização dos princípios inclusivos na busca das competências profissionais como direito de todos os cidadãos.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O estudo apresentou dados que permitiram uma reflexão sobre alguns aspectos que levam o professor buscar novas competência no seu dia-a-dia nos processos de inclusão escolar no ensino regular. Os principais resultados apontaram que as professoras acreditam em inclusão social na escola regular apesar das dificuldades vislumbradas e buscam diariamente refletir e aprimorar o conhecimento para privilegiar com estratégias de ensino os alunos com ou sem necessidades especiais.
Os resultados demonstraram que na percepção das professoras estão cientes de que não aprenderam as praticas educacionais necessárias na promoção da inclusão em suas formações acadêmicas. Por outro lado evidenciaram a que a escolha profissional que fizeram foi suficiente para promover recursos internos na busca de conhecimento e trocas profissionais que dessem conta dos recursos teóricos práticos da docência das series iniciais com alunos portadores ou não de necessidades especiais no ensino fundamental.
As participantes relataram que as dificuldades nos processos de inclusão escolar refletem na motivação de seguir em frente, um passo de cada vez, um dia após o outro, e até mesmo a possibilidade de voltar e retomar quando se faz necessário. Tarefa que exige dedicação, disciplina e vontade.
Os dados obtidos vêm reafirmar que as instituições precisam participar ativamente e dar condições as professoras de preparo profissional, infraestrutura, apoio psicológico e condições materiais na implantação da educação inclusiva a fim de atender as exigências legais e curriculares. Além disso, contribuir para uma pratica profissional mais segura e condizente com as necessidades de cada educador e educando já que as competências no contexto de inclusão escolar não diferem das necessárias no contexto geral.
Resumo monografia para requisito de especialista em Transtornos do Desenvolvimento
Autora: Gruchenska